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Dia Nacional de Luta dos Povos Indígenas

No dia 7 de fevereiro é comemorado o dia Dia Nacional de Luta dos Povos Indígenas, instituída pela Lei nº 11.696 de 12 de Junho de 2008. Esta data rememora o falecimento do índio guarani Sepé Tiaraju em 1756, que foi uma das lideranças dos Sete Povos das Missões e liderou uma das muitas revoltas contra portugueses e espanhóis, contra as determinações do Tratado de Madrid. 

Esta data foi determinada para dar visibilidade à luta constante dos povos indígenas pelos seus direitos, que ocorre até os dias de hoje, como demarcação de terras, preservação dos territórios e conservação da identidade, da cultura e de suas tradições milenares.

Uma das grandes lutas dos povos indígenas é o direito às suas terras. Esse embate é constante entre indígenas, produtores rurais e garimpeiros e tais questões chegam até os Poderes Municipais, Estaduais e Federais, os quais muitas vezes optam por não defender os direitos dos povos indígenas. Neste contexto, surge a tese do marco temporal. 

Em 2009 iniciou-se um debate a respeito do  direito à terra Indígena Raposo Serra do Sol, que estava entre indígenas e agricultores em Roraima. Para resolução, os ministros argumentaram em favor do povo indígena com base na tese do marco temporal. Esta estabelece que as populações indígenas podem reivindicar terras que já ocupavam em 5 de outubro de 1988, na data da promulgação da Constituição.

Por outro lado, esta mesma argumentação abriu espaço para que muitos defendessem também o oposto: que os indígenas não poderiam reivindicar terras em que não tivessem ocupado desde o período anterior à Constituição. 

Esta tese, contudo, não leva em consideração as marcas do período colonial e situações como a expulsão dos povos indígenas de suas terras originárias, fazendo com que estes tivessem que migrar para outros territórios.

O marco vem ameaçando o “direito originário” dos povos indígenas em que a União tem o dever de demarcar todas as terras ocupadas originariamente por esses povos. Tornando-se esta tese aceita pelo Supremo Tribunal Federal, muitos indígenas podem perder suas terras, sendo expulsos caso não consigam a comprovação de que já ocupavam o território em 1988. A luta é, então, de extrema importância e urgência a favor dos povos indígenas. 

Além disso,  preservar a cultura indígena é reconhecer a contribuição do índio na formação dos diversos aspectos da vida nacional. Segundo Ana Gita de Oliveira, Gerente de Identificação e Registro do Departamento de Patrimônio Imaterial-DPI/Iphan: “Preservar as referências culturais dos povos indígenas significa que, ao reconhecê-los como parte fundadora da nossa condição nacional, estamos reafirmando nossas raízes e incluindo-os no campo de nossas políticas públicas. A ação patrimonial tem o papel de ajudar na construção da cidadania, garantindo a esses povos o exercício de plenos direitos. A salvaguarda dos patrimônios indígenas garantirá, às gerações futuras, acesso aos testemunhos de sua história e aos domínios da vida social que dão significado aos complexos processos de construção de identidades”.

Entrevistamos Tereza Arapium, Cacica da Aldeia Andirá onde nasceu, artesã, guia de turismo, ativista ambiental e vereadora suplente no Rio de Janeiro pelo PSOL. 

Que não somente nesta data, mas que diariamente os povos indígenas tenham voz e tenham seus direitos garantidos. Esta luta é de todos nós!

 

Para iniciar nossa entrevista, poderia nos contar brevemente sobre sua trajetória na luta pelos direitos indígenas?

Eu sou filha mais velha de uma família de 10 irmãos, nasci na Aldeia Andirá, Baixo Tapajós, Amazônia,  meu pai sempre foi envolvido na luta ambiental, e nos ensinou o respeito pela natureza e seus habitantes. Nós indígenas já nascemos lutando pela sobrevivência (saúde, educação, cultura), contra o preconceito, o racismo, fascismo, contra o invasor capitalista que sempre quer usurpar nossas terras e tirar nossos direitos originários, e toda forma de violência. Em  2013 eu tive um problema de saúde muito sério e fui curada pelos remédios naturais da Amazônia,  então eu tive um chamado espiritual,  e comecei a minha trajetória como ativista ambiental, participando de movimentos de lutas das mudanças climáticas, movimento em defesa da Baía de Guanabara, e da luta indígena pelos direitos das mulheres, eventos organizados pela APIB (Articulação dos povos indígenas do Brasil) conquistando nosso espaço e visibilidade, em 2020 eu fui candidata a vereadora (primeira mulher indígena a se candidatar  a uma cadeira no legislativo municipal do Rio de Janeiro) pelo PSOL CARIOCA, Sou artesã e faço um intercâmbio de saberes,  entre a cidade grande e nosso povo Arapium, porque acredito que “Juntas (os) somos mais fortes”.

 

Para tornar a entrevista um pouco mais didática, poderia nos contar como surgiu essa data comemorativa e por que dia 7 de fevereiro?

Esse dia nasceu do projeto de um senador com o intuito de homenagear um indígena guerreiro que morreu em combate no dia 07 de fevereiro,  no Rio Grande do Sul. 

 

Como você percebe a articulação política em prol de assegurar os direitos dos povos indígenas na região em que você habita? Há representatividade nos espaços decisórios da sua cidade ou Estado?

Bem eu tô no Rio de Janeiro, vou falar dos indígenas em contexto urbano, a realidade aqui é cruel, indígena aqui não tem direito nenhum, não tem saúde indígena (SESAI), não tem políticas públicas pra educação, nem pra cultura, a invisibilidade é total, ainda temos que lidar com o preconceito, o racismo e discriminação por parte do não indígena. Não há representatividade, existe um órgão chamado CEDIND, que não é atuante e bastante omisso e não me representa. 

 

Na esfera federal, pode-se dizer que o respeito aos direitos constitucionais que tratam das diversas etnias resistentes do território brasileiro é quase nulo, por exemplo a pauta do Marco Temporal. Como essa data comemorativa pode colaborar para a reflexão dos cidadãos a respeito desse assunto?

Quando se trata de direitos originários na esfera Federal, é bem complexo: Nossos direitos originários são garantidos pela Constituição Federal de 1988, nossos territórios, saúde, educação, cultura e nosso modo de viver. Infelizmente só está no papel, porque a todo momento os capitalistas da morte  querem nos calar e mudar a Constituição… O Marco Temporal é mais uma manobra dos ruralistas pra usurpar nossos territórios, se apoderar e implantar seus projetos de morte (agronegócio, hidrelétricas, mineradoras, garimpos, madeireiras) tudo que é nocivo pra vida, além da destruição dos nossos remédios naturais, sítios arqueológicos que preservam nossa história, rios, igarapés (fauna e flora). Com isso acontece o genocídio indígena  o ecocidio etc… Nós somos os povos originários guardiões do meio-ambiente. Após usurpar e destruir tudo, eles vão embora deixando tudo morto para trás (ex: Mariana e Brumadinho). O dia da luta indigena é importante para reflexão “Como será o futuro sob administração de um governo Federal, capitalista, genocida, ganancioso e arbitrário que está fazendo tudo errado propositalmente?” Todos nós temos responsabilidade com o meio-ambiente, tenho dúvidas que algum cidadão vai lembrar e refletir. DIFÍCIL!

O meu sentimento é de me fortalecer cada vez mais, ocupar os espaços na arte (artesanatos, artes plásticas, artes visuais, na política partidária, nas universidades) junto com meus parentes, é nossa forma  de resistir e dar visibilidade a luta indígena que é a demarcação dos nossos territórios. Um ditado: Minha bisavó, mulher indígena de muita sabedoria ancestral, parteira, concertadeira, benzedeira, faleceu com 115 anos, ela falava assim: ” Que no fim dos tempos, só irá sobreviver os seres que estiverem debaixo da Bandeira Verde”. E hoje quando eu vejo as mudanças climáticas, a destruição da Amazônia e da natureza em geral, só posso concordar que ela estava corretíssima 😌

 

Você considera que os não-indígenas têm auxiliado no debate político e anti-racista na qual os Povos estão inseridos? Como essa população pode colaborar mais para essas abordagens e potencializar o alcance das manifestações indígenas em todo o Brasil?

Um pouco, muito pouco, existe um grande preconceito, racismo, discriminação. O povo foi barbaramente colonizado, as pessoas não conseguem ver antes de 1.500, quem são os verdadeiros donos da Terra, que foram expulsos, assassinados e exterminados desta terra. Ex: Carioca é uma palavra indigena e o próprio carioca não sabe a origem. A história contada hoje nos livros foi escrita pelo colonizador, hoje nós temos voz para contar a nossa verdadeira história. 

 

Como estão as discussões acerca da PL 490 atualmente e como essa lei pode afetar negativamente os povos indígenas?

O projeto de Lei 490, cria um “Marco Temporal” Só serão considerados Terras indígenas,  aquelas ocupadas pelos indígenas até 5 de outubro de 1988, data da promulgação da nova Constituição Federal, além de abrir essas terras para a exploração de minérios, garimpos, madeireiras e agronegócio. Então é a entrega total da natureza para o capitalismo da morte, apoiado por Bolsonaro. O PL 490NÃO, tramita no Congresso Nacional. As mudanças climáticas  estão visíveis, só não vê quem não quer. 

Salve a Amazônia!

Salve o planeta!

Salvemos nossas vidas, dos netos, bisnetos etc… É o momento!

Salve os povos originários guardiões das florestas e do meio-ambiente em geral 

Gratidão! ❤️

Tereza Arapium

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