Nosso país tem lidado com uma situação bastante complicada nos últimos tempos em termos de disponibilidade de água para geração de energia. Segundo dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico, o ano hidrológico (período de agosto de 2020 a setembro de 2021) pode ser considerado como o pior desde que se iniciou o monitoramento das condições hidrológicas das bacias do Brasil, portanto o pior cenário em 91 anos. Em realidade, estações mais secas que a média histórica têm sido a regra dos últimos anos e, assim, o nível de muitos dos reservatórios nacionais, hoje, se encontram em seus menores níveis desde 2015. Em meio a esse contexto, podemos ver que esses períodos de escassez de água, cada vez mais frequente, acabam por impactar não somente o setor de energia, mas também todos os usos múltiplos d’água como: fins de abastecimento, irrigação, navegação e pesca.
A Agência Nacional de Águas (ANA), no início de junho deste ano, atendeu a um pedido do Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE) e declarou situação crítica de escassez dos recursos hídricos na Região Hidrográfica do Paraná, que abrange parte dos territórios de cinco estados (GO, MG, MS, PR e SP). Na situação atual (período entre agosto e setembro em especial), a falta de chuvas e redução alarmante dos níveis de água nos reservatórios que são utilizadas para geração de energia elétrica impacta fortemente o subsistema Sudeste/Centro Oeste que é responsável pela maior parte da geração de energia elétrica que chega até os consumidores no Brasil. Além do papel de geração, é importante destacar que esses reservatórios funcionam como verdadeiras “baterias de energia”, além de serem indispensáveis para a gestão de recursos hídricos quando olhamos os usos múltiplos d’água tanto a jusante quanto a montante das barragens.
Segundo Renata Ruggiero Moraes, diretora-presidente do Instituto Iguá de Sustentabilidade, a crise que vivenciamos está relacionada a uma série de fatores que inclui a má gestão dos recursos hídricos, além do fato dos impactos em recursos naturais gerarem um efeito em cadeia em diversas escalas.
Todas as coisas estão unidas, mas não geridas de forma conectada. O avanço da fronteira agrícola, desmatamentos, isso tudo impactando no ciclo da água, na frequência das chuvas. Diminuindo a vazão dos rios, intensificando as secas, enfim, tudo está conectado. E o poder público precisa melhorar a governança dos recursos hídricos, a eficiência do uso da água, a segurança hídrica, garantir a preservação das bacias e proporcionar maior acesso a água e saneamento, já que despejando esgoto sem o devido tratamento, poluímos. É um trabalho de gestão e segurança hídrica como um todo. Todos sabem a importância da água. Sabem que ela é um elemento vital. Passamos dias sem comer, mas não sem beber.
Renata Ruggiero Moraes, diretora-presidente do Instituto Iguá de Sustentabilidade
A seguir, temos alguns gráficos gerados e apresentados pelo ONS durante o último Programa Mensal da Operação (PMO) com relação as condições meteorológicas e hidrológicas de algumas bacias hidrográficas.
Gráfico de chuva acumulada em algumas Bacias Hidrográficos de Interesse no período de setembro a outubro (verificada x média histórica). Fonte: ONS
- Tocantins com déficit em todo o período considerado, assim como no Paranaíba
- Uruguai com Superávit de precipitação em todo período considerado
- São Francisco começando a ter saldo positivo em relação a média dos dados históricos de precipitação
- Demais bacias começando a apresentar melhores cenários de chuva com a entrada da transição entre período seco e úmido
A seguir, temos um gráfico sobre os efeitos das precipitações sobre os dados de vazão no período considerado em bacias de interesse assim como nos subsistemas como um todo.
Tabela com dados relacionadas as vazões. Fonte: ONS. *MLT (Média Linha Histórica)
Podemos ver dessa forma, mais claramente, em especial nos meses de agosto e setembro, um cenário muito desfavorável para bacias do Rio Grande e Paranaíba. No entanto, a partir das chuvas de outubro, houve uma clara melhora no regime de vazões nessas respectivas bacias. As chuvas de outubro, portanto, foram muito bem-vindas e já geraram certo grau de melhoria no regime de vazões nessas regiões.
- Olhando para o Período (maio – outubro) tivemos a 2º pior condições hidrológicas para a bacia do Paranaíba.
- Pior condição hidrológica para o subsistema Centro-Oeste/Sudeste (Sudeste é bastante influenciado pelas condições hidrológicas do “Grande” e “Paranaíba”, logo tanto em agosto quanto em setembro, foram observados os piores cenários nos dados de vazões nesses 2 meses)
- No contexto do SIN por completo, houve o pior período maio-outubro. Desde o início do período seco, com os piores meses do histórico. Leve melhoria em setembro e outubro com uma recuperação significativa.
Esse ano de 2021, com a transição do período seco para o período chuvoso (2021-2022), não há indicativo de atraso nas precipitações visto que elas já começaram a ocorrer de maneira a ajudar as condições hidrológicas em determinadas bacias (sinal positivo). No entanto, isso ainda não dá certeza sobre como será o ano hidrológico 2021-2022. É um bom sinal não começar com condições de atraso no regime de chuvas.
Vinicius Forain, gerente da programação da operação no ONS
Condições dos Principais Reservatórios do Subsistema Sudeste atualizados em 02/11. Fonte: ONS
Para saber mais sobre o assunto, separamos algumas matérias interessantes que estão disponíveis nos links abaixo.
https://ineep.org.br/a-crise-hidroenergetica-para-alem-de-suas-causas-naturais/